Economista com pós-graduação em desenvolvimento econômico e planejamento regional em Israel. Atualmente é vice-presidente do Instituto do Ceará (Histórico, Gegráfico e Antropológico) e da Academia de Ciências Sociais do Ceará, bem com sócio fundador da Academia Cearense de Ciências. É professor titular (aposentado) do programa de mestrado (CAEN) da Universidade Federal do Ceará, onde foi também Pró-Reitor de Planejamento. No Banco do Nordeste, ocupou o cargo de economista e Chefe da Divisão de Estudos Agrícolas do Escritório Técnico de Estudos Econômicos(ETENE). No período de 1995-2002, exerceu a função de Secretário de Estado de Desenvolvimento Rural do Ceará. Publicou cerca de 40 livros em sua área de especialização e escreveu muitos artigos para jornais e revistas.
PRINCIPAIS
QUESTÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS
ANTE
A CRISE MUNDIAL: O CASO DO BRASIL.
APRESENTAÇÃO
Um dos
principais temas políticos da atualidade
é como enfrentar os desafios econômicos e sociais da crise em nossos países. No mundo inteiro, as nações
e sociedades deparam-se com problemas ligados à recessão, ao desemprego e
déficits fiscais que geraram uma verdadeira turbulência internacional, com consequências
difíceis de prognosticar sobre o que poderá acontecer nos próximos anos no Brasil
ou em âmbito planetário.
Nos dias 10 e 11 de maio de 2012 foi realizada em Lisboa( Portugal) uma Reunião
Extraordinária Conjunta Brasil na Lusofonia para examinar tais assuntos. Essa
iniciativa foi promovida pelas Academias de Ciências Sociais do Ceará ( da qual
sou vice-presidente), a Sociedade de Geografia de Lisboa, a Sociedade Portuguesa
de Estudos do Século XVIII e o Instituto Superior de Ciências Sociais e
Políticas da Universidade Técnica de Lisboa.
No Colóquio referente
à Crise Mundial e suas repercussões no Brasil e Portugal, tive a honra de
proferir uma palestra sobre Principais Questões Econômicas e Sociais ante a
Crise Mundial: o caso do Brasil. Participaram deste evento os sócios das
academias mencionadas, além de renomadas autoridades convidadas, dentre as
quais convém mencionar o embaixador
Doutor Francisco Knopli e a
professora Doutora Maria Helena Carvalho dos Santos, presidente da Sociedade
Portuguesa de Estudos do Século XVIII, e organizadora do evento.
Esta Crônica sintetiza a palestra que pronunciei no auditório do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa, durante o referido Colóquio.
A CRISE MUNDIAL DE 2008
O renomado economista Jeffrey Sachs declarou
no seu livro sobre o Fim da Pobreza- 2005 que o grande economista inglês John
Maynard Keynes não se intimidou com a grande Depressão de 1930. Numa época de
muito sofrimento humano, como é conhecido, ele previu o fim da pobreza na Grã-Bretanha
e outros países industriais até o fim do século XX.
Em 2005, Jeffrey afirmou em sua celebrada
obra: Keynes tinha razão: a miséria não existe mais nos países ricos de hoje e
está desaparecendo na maioria dos países de renda média do mundo.
Tive a feliz oportunidade de revisitar
alguns países do primeiro mundo nessa época e compilei muitas informações sobre
o desenvolvimento econômico dos dez mais importantes países, entre eles os
Estados Unidos, Japão, França, Inglaterra, Israel, Escandinávia e com
informações relevantes da própria União Europeia.
Como resultado desses estudos, que tenho
realizado ao longo de 40 anos, elaborei e publiquei um livro focado no tema de
desenvolvimento regional e rural do mundo, que é um dos ramos de minhas atividades
acadêmicas e profissionais. As conclusões a que cheguei sobre esses países
foram muito animadoras.
Nesses anos iniciais do novo milênio, estive
em Portugal algumas vezes onde observei que a terra mãe estava passando por
grande prosperidade. Era o que todos diziam e eu vi com os meus próprios
olhos... No Brasil se falava que
Portugal seria o portal de entrada do nosso país na União Europeia, e alguns
economistas faziam cálculos mirabolantes de transações comerciais e turísticas.
Atualmente a balança comercial entre os
dois países é pouco expressiva e sem tendências previsíveis.
Enquanto
isso, o prêmio Nobel de economia (2001) Joseph Stiglitz, que escreveu um
celebrado livro sobre os Exuberantes Anos 90, lançou recentemente uma
volumosa obra acabrunhadora: Freefall (queda livre) tratando da crise do
mercado livre e a submersão da economia global (2010) nos Estados Unidos e na
Europa. Entre outras coisas ele diz: Eu penso que todos nós deveríamos ter um
determinado grau de humildade e reconhecer que não estamos ganhando a luta
contra a crescente pobreza no mundo.
É
difícil acreditar, disse recentemente o prof. Paul Krugman( Prêmio Nobel de
Economia 2008), que economistas como
Olivier Blanchard ( MIT), Robert Lucas
(Universidade de Chicago) e Ben Bernanke (Princeton) tenham comemorado o
desenvolvimento econômico das últimas duas décadas pouco antes da hecatombe
financeira mundial.
De fato, a crise que começou nos Estados
Unidos e cedo se tornou global. Em pouco tempo milhões de pessoas na América do
Norte perderam suas casas e empregos. Muitos outros sofrem da ansiedade porque
aplicaram suas poupanças para aposentadoria ou educação dos seus filhos e não
sabem se recuperarão esses valores em termos reais. Relatório recente da Organização
Internacional do Trabalho informa que em
2011 cerca de 50 milhões estavam sofrendo o trauma da desocupação, dos quais 20
milhões somente na China. A falta de trabalho remunerativo na Espanha,
especialmente de pessoas mais jovens, alcança cifras inimagináveis, para não
falar da tragédia da Grécia que é de
conhecimento de todos.
Muitos são as conjecturas e teses sobre as
causas da turbulência dos mercados e das repercussões da crise econômico em
curso. Mas o que parece oportuno para os pensadores e líderes políticos é idealizar
que tipo de economia deveria ser arquitetado para o futuro. Para isso, há necessidade de uma ação coletiva e que o
governo tenha um papel fundamental na regulação das atividades econômicas, sem
sufocar os mercados.
Acredito que diante de tão complexa situação, resta-nos refletir sobre o que nos disse o professor Aníbal Cavaco Silva (Presidente de Portugal) em um dos seus escritos: Há três ideias que devemos ter presentes quando falamos de Portugal: Esperança, Confiança e sentido de Futuro, que se aplicam perfeitamente ao caso do Brasil.
AS REPERCUSSÕES DA CRISE NO BRASIL
O
Brasil está entre as seis maiores economias planetárias, com 192 milhões de
habitantes e um Produto Interno Bruto de
2,5 trilhões de dólares em 2011. As estimativas são de que em 2015 o
Brasil assumirá a quinta posição, ultrapassando a França. Atualmente o 1º lugar
é dos Estados unidos ( US$15 trilhões), seguido
da China, Japão, Alemanha e França.
Esses
dados para o Brasil, no entanto, não
significam padrões de desenvolvimento semelhantes, pois sua renda per capita é
de apenas US$ 11 mil colocando o Brasil em 74ª posição mundial, enquanto a
Noruega está em primeiro lugar com US$ 53 mil. O Índice de Desenvolvimento
Humano do Brasil encontra-se em 84ª
colocação ( 0,718) e a produtividade do
trabalho é apenas uma fração dos países mais desenvolvidos.
Um
pequeno diagnóstico da economia brasileira poderá ajudar melhor o entendimento
da verdadeira situação do nosso país ante a crise mundial que estamos
atravessando.
Desde a década de 1930, o Brasil encontra-se
num processo de continuado crescimento
econômico, transformações sociais
e participação política. Os períodos da ditadura de Getúlio Vargas e do governo
militar ( 1964-85), bem como a hiperinflação dos anos 80 e os programas de
ajustes dos anos de 1990, não prejudicaram a marcha de progresso e de
modernização da economia
Esse
processo gerou também uma grande concentração
da renda e iniquidade, fazendo do Brasil atualmente um dos países mais
desiguais do mundo e com uma população gigantesca de pobres. São 50 milhões de
pessoas abaixo da linha da pobreza ( com renda mensal de menos de ½ salário mínimo). Destes, 16 milhões
são miseráveis, com mais ou menos US$ 1 por dia. Disso emergiu um contraste de padrões de
consumo de segmentos da população semelhantes aos dos países desenvolvidos. Mas
a maioria dos habitantes brasileiros está
excluída desses benefícios.
A Constituição de 1988 consagrou uma atenção
especial a esse problema da desigualdade
do crescimento econômico, priorizando os direitos sociais universais. Mas, segundo análise do professor
Edmar Lisboa Bacha ( 2011) Brasil: A Nova Agenda Social do Brasil - nos
últimos anos, o Brasil está encontrando
crescentes dificuldades em suas políticas sociais mais importantes. Saúde,
políticas de renda, educação, segurança pública, previdência social, mesmo com
a economia em crescimento.
No passado, quando ocorriam problemas similares decorrente de recessão econômica, arrecadação de impostos etc., a expansão dos gastos públicos era financiada pela inflação, pelo aperto na arrecadação tributária ou pela contratação de dívida pública. Hoje com impostos de 39% do PIB e a inflação sob controle, aflui uma crise financeira interna. Além disso, as políticas sociais são muito mais complexas e caras do que no passado. Há estudos, mesmo assim, que demonstram que os resultados insatisfatórios das políticas sociais em andamento não se explicam pela falta de recursos, mas pelo mau uso do dinheiro público.
CONCLUSÕES
De modo particular em relação à crise atual, o Brasil não tem sido afetado de modo preocupante porque o país tem uma frágil dependência externa, e até se beneficiou com a elevação dos preços das commodities. Quanto ao sistema bancário, temos um dos mais sólidos do mundo, em face das políticas de saneamento e fiscalização adotadas desde o início do Plano de estabilização em 1995.
Contrariando as previsões catastróficas da
economia mundial nos últimos anos, a ideia básica do Brasil é trabalhar por uma
nova ordem econômica, redefinindo atribuições do Estado e das empresas privadas
na construção de um novo modelo de
desenvolvimento econômico.
Essa
nova engenharia econômica deve dar prioridade aos desafios no campo social, a fim de superar a pobreza
absoluta e as profundas desigualdades que estão sendo reduzidas, mas ainda são
chagas dramáticas e inadmissíveis na sociedade moderna.
O Brasil agora
não precisa apenas crescer, pois já faz isso há mais de um século. É necessário
distribuir urgentemente os frutos do crescimento à medida que eles surjam. Um
país com a rara diversidade e as
dimensões continentais do Brasil,
precisa doravante avançar na exploração dos seus recursos naturais de modo sustentável,
melhorar a qualidade dos gastos públicos e investimentos, controlando a
corrupção do setor público, que é o maior câncer da atualidade brasileira. Ampliar e melhorar a cobertura e qualidade da saúde
publica. Atacar com todas as armas os problemas da segurança e criminalidade,
especialmente dos estados mais pobres, e melhorar a qualidade do ensino
fundamental público, que é uma calamidade.
Para citar apenas mais dois desafios
emergenciais, cito a questão fiscal e tributária que oprime as iniciativas
produtivas e confiscam os baixos rendimentos dos trabalhadores.
Em
resumo, queremos um Brasil mais forte e solidário, melhorando os índices de
bem-estar material e espiritual, e despertando em cada um dos seus filhos o
sentimento de pertencer e de ter amparo em suas necessidades básicas de
educação, saúde, habitação, garantia alimentar e segurança.
Com isso, poderemos manter acesa a esperança de que as dificuldades do presente não são um sacrifício inútil, mas parte do esforço comum para um amanhã melhor. Mas estou convicto de que tudo isso só se conquistará, duradouramente, com fé na democracia e pela democracia.
Lisboa, 11/05/2012
*Pedro Sisnando Leite é Professor Titular(aposentado) do CAEN/UFC e Vice-Presidente da Academia de Ciências Sociais do Ceará e do Instituto do Ceará( Histórico, Geográfico e Antropológico).